top of page

ROBERT SIMONSEN: planejamento central e corporativismo

Otavio Herculano Augusto Ribeiro¹


Robert foi presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e fez parte do Concelho Federal de Comércio Exterior, local onde debateria contra Eugênio Gudin (economista liberal) sobre o planejamento central no Brasil. A importância de Simonsen se dá por conta de seus pensamentos econômicos e pela sua competência ao escrever o livro História Econômica do Brasil, sendo importante até os dias de hoje para a compreensão da realidade nacional e tendo sido o livro que influenciaria Celso Furtado.

Neste artigo, buscarei trazer algumas partes do pensamento de Robert Simonsen sobre a economia e sua importância dentro dessa área de ensino, mesmo não sendo economista acadêmico, ele buscava expor e traçar rotas de um pensamento econômico de alta importância, que seria seguido por diversos economistas e influenciaria vários nacionalistas pelo Brasil.


Racionalização Econômica e o Planejamento Central


No pensamento de Robert Simonsen, o Estado não deve ser um mero observador da economia, um ente que não interage com o ambiente, assim como ele não prega a ação estatal em uma forma descomunal e com planejamentos sem tecnicidade, o mesmo propunha uma racionalização do Estado e da economia, quase como que na tradição positivista, de criação de uma entidade governamental técnica e racional.

Simonsen encontrava, no Brasil, condições quase coloniais, já que ele viveu o período da Primeira República e conhecia bem as condições dos operários nas fábricas em que geria. Dentro de seu pensamento, estava justamente a visão mais técnica possível para possibilitar avanços produtivos reais no país, para que desse modo, o país pudesse alcançar grandes avanços econômicos; sem muito tempo a perder.

Nesse sentido, o planejamento central em Robert Simonsen tinha o objetivo máximo de levar o país a avanços consecutivos, e muito se usava dos aspectos históricos de cada povo e de cada nação para demonstrar que o Brasil deveria iniciar o processo de racionalização da economia que se dá pela seguinte definição:


Um sistema de organização econômica que deve produzir um acréscimo do bem-estar nacional pelo abaixamento dos preços, um aumento da quantidade e uma melhoria na qualidade dos bens produzidos. (SIMONSEN, Robert) As Finanças e a Indústria. Pág. 24


Robert retira esse termo da economia alemã, principalmente de tempos anteriores a primeira Guerra Mundial e no período entre guerras, onde ele afirma que:


A racionalização alemã tem, assim, além do alcance econômico uma função social. (SIMONSEN, Robert) As Finanças e a Indústria. Pág. 24


E segue com uma citação para além:


«A racionalização, ou o estabelecimento da economia integral, é a sistematização econômica dos processos de produção e circulação elevada a um alto grau, tanto na economia nacional quanto na economia privada. O abastecimento da coletividade pelos meios menos custosos é a tarefa social da produção e da circulação das riquezas. Nesse sentido de função social, a racionalização visa criar os bens pelas empresas mais bem aparelhadas, com os mais baixos custos de produção, e encurtar os caminhos da circulação desde os produtores até os consumidores. (SIMONSEN, Robert) As Finanças e a Indústria. Pág. 25


Sendo mais explicativo, a economia integral seria um regime onde a economia planejada tem funções sociais, com o objetivo se ser o mais eficiente possível, sendo coordenado sua distribuição para que seja menos custosa. Esse pensamento muito utilizado na Alemanha weimariana² para ajeitar a própria economia, e foi aplicada de forma adaptada a realidade brasileira durante o Estado Novo e no pensamento de Alberto Pasqualini.

Muito se utilizada do método produtivo de Henry Ford, que seria o de produção rápida e eficiente, aplicando métodos científicos e tecnológicos nos meios de fabricação para que fossem: 1° menos custosos; 2 ° mais produtivos; 3° trouxessem mais qualidade. Essa concepção de como utilizar do meio de produção é muito necessária para se compreender o processo de «cientificação» da economia, pois ela não pode ser meramente matemática, porém deve estar interligada a tudo para que traga maiores níveis de eficiência.

É citado a criação da Reichskuratorium, em nome completo Reichskuratorium für Wirtschaftlichkeit (Comitê Nacional para a Racionalização da Economia), a qual, criada em 1921, tinha por objetivo juntar técnicos e especialistas para que em colaboração com as empresas alemãs traçassem estratégias financeiras e administrativas para as mesmas, muito inspirada em Taylor e Ford, ela fazia estudos de tempo e movimento, leiautes fabris otimizados e mais eficientes, auxiliava para reduzir as percas por desperdícios, treinamentos técnicos para trabalhadores, melhoria efetiva no transporte das mercadorias e auxílios financeiros. Os resultados da RKW foi que sua atuação foi uma inspiração para modelos desenvolvimentistas, como o Brasil durante 1930 a 1950 e que ajudou a Alemanha Ocidental no pós-guerra a se reestabelecer.

Houve também o Fliessende Arbeit (trabalho em fluxo), similar ao modelo fordista dos Estados Unidos, onde uma linha de produção instalada para maximizar a produção em um tempo cronometrado, ou seja, um sistema completamente baseado em organização e velocidade. Os alemães criaram uma síntese entre as ideias de Frederick Taylor (administração científica do trabalho) e Henry Ford (velocidade de produção), buscavam tratar o trabalhador como colaborador técnico da indústria, além de tornar o processo mais centrado em planejamento das forças públicas com as forças privadas, garantindo assim o reavivar da economia alemã, esses saltos que tornaram o sistema uma economia mista organizada, chegando perto de um modelo corporativista (podendo evoluir, caso os trabalhadores tivessem voz dentro do próprio trabalho) e de evolução do pensamento técnico no planejamento central econômico.


Mas para além disso, as ações em volta da própria economia dos operários eram necessárias, Simonsen diz sobre a experiência nos Estados Unidos:


Enquanto, após a guerra, o custo de vida aumentou 75%, os salários aumentaram 100%, permitindo um grande aumento de bem-estar para as classes operárias. (SIMONSEN, Robert) As Finanças e a Indústria. Pág. 16


Nessa percepção, os salários não são custos para a empresa, mas são investimentos nos próprios operários, para que assim tenham condições de comprar e desfrutar mais das condições econômicas que seu trabalho lhe permite ter. Essa é a visão sobre a racionalidade da economia, deixarei com que Robert Simonsen diga suas considerações sobre a racionalização alemã:


É de justiça assinalar, porém, que a racionalização não é uma obra puramente alemã. Os alemães estudaram profundamente a experiência de todas as nações adiantadas, principalmente o scientific management americano, de onde trouxeram ideias fundamentais para o seu trabalho. Souberam, no entanto, sistematizar com maestria todos esses progressos, aos quais juntaram suas próprias ideias, dando-lhes novas fórmulas e criando, com sua meticulosidade de observação e atuação, um espírito eminentemente científico — um verdadeiro corpo de doutrina, cujos efeitos terão real repercussão sobre os destinos da humanidade. (SIMONSEN, Robert) As Finanças e a Indústria. Pág. 37


Direi, portanto, que o pensamento sobre o planejamento central não pode ser visto meramente como ações desconcertantes do próprio governo, mas deve ser a ação mais racional a ser tomada, muito admirável o trabalho dos alemães durante o período da crise dos anos 20, implementarem sistematizações da própria economia para avançarem e gerarem o espaço necessário para prosperar as ideias de desenvolvimentismo e de economia mista.

Essa quebra na vista do planejamento central como meras ações governamentais se tornou essencial dentro do pensamento econômico de Robert Simonsen, visto que a proposta de unir a ciência, a técnica, a especialização, a racionalidade e a integração econômica, eram os caminhos necessários a serem percorridos para alavancar a economia nacional, contudo, não seria prudente meramente aplicar o que a Alemanha aplicou, seria necessários observar as particularidades da realidade brasileira, e para além disso, propor um sistema que superasse o alemão, visto que os próprios fizeram um sistema que, por mais que seja inspirado, era certamente mais eficiente que demais outros modelos mundiais. O Brasil teria sua própria particularidade, principalmente durante o Estado Novo (1937 1945), esse seria o corporativismo.


Corporativismo em uma Economia Mista


O corporativismo foi com certeza um dos debates mais intensos desse período do Brasil, tanto por suas características comparadas a demais outros países que diziam-se aplicar o mesmo sistema econômico (Itália 1922-1943 e Portugal 1933 1974). O sistema caracteriza-se por sua visão de organização da economia micro e macro, quando se coloca os meios de produção estariam organizados em corpos sociais, em sindicatos de operários (de diversas categorias), de patrões, burocratas, cooperativas, técnicos, entre outros, de forma que cada grupo represente de fato os interesses reais da sociedade, podendo limitar o poder e/ou as ações políticas dos partidos ou até mesmo do Estado.

Esse modelo pode ser visto como apaziguador das lutas de classes, você tem os exemplos mais concretos na formação econômica do Estado Novo em Portugal e no Brasil. Em Portugal, o objetivo de Antônio de Oliveria Salazar era trazer princípios cristãos para o sistema econômico português, juntamente com as visões de estabilidade e autossuficiência produtiva, como fora a Campanha do Trigo, que produziu grandes quantidades de alimentos, mesmo que houvesse tido problemas de organização e econômicos durante esse período de tempo. Nesse tempo, Portugal se tornava um reflexo de ideias ligadas ao pensamento católico e ideias de manutenção do regime português, visando muito mais a organização produtiva com bases católicas no país do que necessariamente tornar o país um dos maiores do mundo.

No Brasil, durante o período do Estado Novo do presidente Getúlio Vargas, o país viveu um sistema corporativista, muito alinhado a uma ideia pragmática econômica, onde visava atingir melhores resultados em tempo curto. Os sindicatos eram conectados ao Ministério do Trabalho (ao contrário de Portugal, os quais exerciam também funções legislativas) e com o objetivo de mostrar categoricamente os interesses dos operários ao governo, integrando a visão dos operários nas condições de um nacional-desenvolvimentismo. Dentro do Estado Nacional, havia também a presença de um pensamento Saint-Simoneano:


Para Saint-Simons, [...] a vida econômica deve constituir, com exclusividade, toda a substância da ordem política. A seu juízo, não deve existir apenas uma política de interesses econômicos, mais do que isso, predica ele, além dela, não deve haver outra qualquer. A política, afirma, é a ciência da produção. (ARRAES, Monte} O Estado Novo e Suas Diretrizes. Pág. 97-98


Nessa perspectiva, o objetivo máximo do Estado Novo era ordenar a economia para que causasse desenvolvimento máximo no país.

Em Robert Simonsen, encontra-se o apoio a ideia corporativista, principalmente nas ideias de representação das classes sociais, pois em sua percepção, a eliminação da pobreza era o caminho necessário para levar o país ao progresso econômico e que os operários tenham acesso a um ganho médio que garanta uma existência digna. Tudo isso seria alcançado com a indústria sendo a base das ações econômicas nacionais.


É numa política industrial fundada em bases racionais adequadas às condições de nosso meio que teremos que ir buscar, principalmente, a produção dos valores em bens sociais de que necessitamos para o rápido aumento de nosso poder aquisitivo e porque não o dizer, com os benéficos reflexos de adiantamento de processos de trabalho que a industrialização sempre conduz. (SIMONSEN, Robert)

As ideias de Simonsen eram baseadas em um corporativismo que não tinha por objetivo o autoritarismo, mas sim o benefício geral de todas as classes sociais.

Com isso, podemos dizer que, nas bases do corporativismo de Robert, estava a busca pela harmonia entre capital e trabalho por meio da mediação estatal e da representação organizada das classes sociais, sem a supressão da autonomia individual nem a imposição autoritária de um único modelo político.

Seu corporativismo era essencialmente funcional: servia como ferramenta de coordenação produtiva e de justiça social dentro de uma economia mista, na qual o Estado atuava como indutor do crescimento, sem eliminar por completo as liberdades de mercado ou a propriedade privada.

Ao contrário do corporativismo fascista italiano, que se estruturava dentro de um Estado totalitário e com forte repressão aos sindicatos autônomos, o modelo brasileiro nas percepções de Simonsen deveria buscar o equilíbrio entre o planejamento estatal e a ação privada, buscando um caminho de racionalização.


Conclusão


Simonsen não buscava um autoritarismo e muito menos uma cópia de modelos internacionais, mas buscava inspirações nos pensamentos políticos e econômicos estrangeiros, adaptando-os para a realidade nacional, visando consolidar uma organização econômica eficiente.

As questões relacionadas ao planejamento central e o corporativismo, nas perspectivas de Robert Simonsen, eram relacionadas a visão de desenvolvimento nacional e melhoria das condições sociais da classe trabalhadora. Nesse sentido, a economia deve ser organizada em caminhos de racionalidade, aprimoramento dos métodos produtivos, solidariedade na representação de classe e no progresso do bem-estar social.

Mesmo estando posicionado em linhas pouco conhecidas no meio desenvolvimentista, Simonsen foi e ainda é muito importante, tanto para conhecer o Estado Novo quanto suas ideias, que seriam influentes em Celso Furtado e em diversas perspectivas nacionalistas, demonstrando que o caminho do Brasil, para além do desenvolvimento, é o caminho da racionalidade econômica e do progresso do país em prol da prosperidade.


¹ - Técnico em Segurança do Trabalho, estudando Gestão Pública pela UNIMES, editor de livros e tradutor independente.

² - República de Weimar


Bibliografia:


ARRAIS, M. O Estado Novo e suas Diretrizes: Estudos Políticos e Constitucionais. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1938.


CARDOSO, A. Estado Novo e Corporativismo. Locus: Revista De História, vol. 13, nº 2, agosto de 2011. Disponível em: https://periodicos.ufjf.br/index.php/locus/article/view/20167.


CUNHA, E. P., & Guedes, L. T. A administração política de Roberto Simonsen e a ideologia da terceira via no capitalismo atrófico brasileiro. Revista Eletrônica de Administração, 28(3), 693–717.


CURI, L. F. B., & Cunha, A. M. Redimensionando a contribuição de Roberto Simonsen à controvérsia do planejamento (1944–1945). América Latina en la história econômica, 22(3), 1-32.  Disponível em: Historia https://www.scielo.org.mx/pdf/alhe/v22n3/v22n3a3.pdf


FREITAS, M. J. I Congresso Brasileiro da Indústria: momento de consolidação das ideias de Roberto Simonsen como parte da ideologia da burguesia industrial brasileira. Em Tese, 15(1), 33–58. https://doi.org/10.5007/1806-5023.2018v15n1p33. HACKETT, T. Salazar's Portugal.


New Polity, 24 Jan. 2022, Disponível em: https://newpolity.com/blog/salazars-portugal. MATTOS, J. R. Corporativismo em Portugal. Edição da União Nacional. Lisboa, 1936.


SIMONSEN, R. As Finanças e a Indústria. São Paulo Editora Limitada. Abril de 1931.

SIMONSEN, R. Ensaios Sociais, Políticos e Econômicos. Edição da Federação das Indústrias de São Paulo. Janeiro de 1943.

Comentarios


bottom of page